Requerente: Comissão - PAD/2022Requerido: Reginaldo dos Reis da SilvaProcesso Administrativo: 006/2022
I – RELATÓRIO
Trata-se de Processo Administrativo Disciplinar, em desfavor de Reginaldo dos Reis da Silva, objetivando apurar suposto abandono de Cargo Público, na forma do art. 152, inciso I, da Lei Municipal nº 107/90.
Compulsando os autos do Processo Administrativo Disciplinar nº 006/2022, verifica-se, de início, que fora regularmente instruído nos moldes das Leis 107/90, 8.112/90 e 9.784/99, com fundamento na Portaria 002/2022, assim como no Decreto nº 10/2021.
Além disso, como consta às fls. 40/42, o Requerido foi regularmente citado para apresentar sua defesa, sendo-lhe garantido, portanto, seu inafastável direito fundamental à ampla defesa e ao contraditório.
Regularmente citado, não apresentou defesa (fl. 43).
Posteriormente, uma vez que o Requerido não apresentou defesa e levando-se em consideração o disposto no art. 164, parágrafo 2º, da Lei nº 8.112/90, fora nomeado defensor dativo para o mesmo (fl. 54/59).
Fora apresentada defesa pelo então designado Defensor Dativo (fl. 52/53).
A Comissão Processante, às fls. 60/64, recomenda a imediata demissão do servidor.
Parecer jurídico, às fls. 66/73, opina pela imediata demissão do demandado.
II – FUNDAMENTAÇÃO
Sem questões preliminares a serem enfrentadas, passo, desde logo, a analisar o mérito do objeto que versa os presentes autos: saber se o Requerido abandonou ou não o serviço público.
Pois bem. Compulsando os autos para prolatar decisão final, em especial, os documentos de fls. 24/32, verifica-se, de pronto, que existe robusto acervo probatório, suficiente para configurar o abandono de cargo pelo Requerido. Explico.
De acordo com a doutrina e a jurisprudência dos tribunais superiores, são necessários que existam, cumulativamente, dois requisitos básicos, que se pode extrair do próprio art. 138 da Lei 8.112/90, para que reste configurado o abandono de cargo público.
O primeiro elemento, de ordem objetiva, diz respeito ao transcurso do prazo, que se efetiva com ausência do agente público por um lapso temporal superior a 30 dias consecutivos ao local de trabalho.
Pelo que consta nestes autos, o Requerido está ausente do serviço público há mais de 3 (três) meses, quando da instauração do PAD, e não há notícia de que retornou ao local de trabalho, perfazendo período bem superior ao tolerado pela Lei.
Ademais, os documentos de fls. 24/32 e 36/39, não deixam qualquer dúvida de que o Requerido se ausentou, injustificadamente, ao seu posto de trabalho, por período superior ao tolerado pelas normas de regência.
O segundo requisito, igualmente substancial, porém, de ordem subjetiva, leva em conta a intencionalidade do agente, isto é, a consciência de que está abandonando o cargo público intencionalmente, denominado pela doutrina e jurisprudência de animus abandoandi. Vejamos:
“EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - DIREITO ADMINISTRATIVO - DEMISSÃO POR ABANDONO DE CARGO - ANIMUS ABANDONANDI CONFIGURADO - INEXISTÊNCIA DE BOA-FÉ DO SERVIDOR - POSTURA NEGLIGENTE PERANTE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RECURSO NÃO PROVIDO.
O STJ já consolidou a tese de que a demissão de servidor público estável e efetivo, por abandono do cargo, apurado em processo administrativo disciplinar, depende de comprovação do elemento subjetivo: animus abandonandi. Havendo posição desidiosa do servidor público, que se ausenta de maneira deliberada do serviço público e busca de maneira retardatária a solução de seus conflitos com a Administração Municipal, o animus abandonandi encontra-se configurado, havendo ensejo para demissão”.
No mesmo sentido os precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
“ADMINISTRATIVO. MANDADO DESEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. PAD. FATO. APURADO: ABANDONO DE CARGO. PENA APLICADA: DEMISSÃO. NÃO DEMONSTRAÇÃO, PELO IMPETRANTE, DA AUSÊNCIA DE ANIMUS ABANDONANDI. ORDEM DENEGADA, EM CONFORMIDADE COM O PARECER MINISTERIAL. 1. Trata-se de Mandado de Segurança onde se pretende a concessão da ordem para anular penalidade de demissão aplicada a Servidor Público em razão de ter se ausentado do serviço pelo período de 16 denovembrode2014a 31 de agosto de 2015, deixando de exercer suas atribuições por mais de trinta dias consecutivos. 2. A configuração da infração administrativa de abandono de cargo depende, além da ocorrência de faltas injustificadas no período de 30 dias consecutivos, também da demonstração do ânimo específico de abandonar o cargo. 3. O elemento subjetivo que caracteriza o animus abandonandi terá de ser apreciado com cautela, não sendo suficiente a constatação do abandono do cargo, mas a razão que levou a tal atitude - e o ônus da prova incumbe ao funcionário -, é necessário que haja, quanto ao agente, motivo de força maior ou de receio justificado de perda de um bem mais precioso, como a liberdade, por exemplo. 4. Não se pode esquecer que o Direito Sancionador deve pautar-se em dois princípios, o princípio da razoabilidade, que assevera que os atos realizados por administrador público devem pautar-se pela razão, pela lógica, pela plausibilidade das justificativas, e, ainda, o princípio da proporcionalidade que recomenda, dentre as diversas condutas a tomar, que o administrador escolha a melhor para o caso, de modo proporcional ao interesse público que ele pretende alcançar.5. Não há dúvidas de que, a tipificação da infração administrativa de abandono de cargo, punível com demissão, exige para completar-se o elemento objetivo e o elemento subjetivo. Se um destes não resta demonstrado durante a instrução processual disciplinar, (Servidor não faltou injustificadamente ou não tinha a intenção de abandonar o cargo público de que estava investido) não há o que se falar em penalidade de demissão para o mesmo. 6. No caso, não há nos autos notícias de que o impetrante conseguiu comprovar os problemas de saúde por ele alegados, extraindo-se, inclusive, dos documentos juntados às fls. 3.116, 3.176 e 3.183, que ele não teve sua licença médica renovada e, ainda assim, esquivou-se de retornar ao trabalho sob alegação de necessidade de tratamento de saúde. Verifica-se, ainda, que as diversas tentativas de intimação do Servidor para comparecimento em atos do processo, bem como para realização de perícia, foram infrutíferas. 7. Ordem denegada”.
No caso vertente, observo que o segundo requisito também restou satisfeito, isso porque o demando não apresentou qualquer justificativa ao deixar de comparecer ao seu local de trabalho, não solicitou qualquer tipo de licença, quer seja para tratar de assunto pessoal, quer para tratamento de saúde, o que caracteriza a sua intenção de não mais continuar no serviço público.
Quanto às alegações trazidas pelo defensor do Requerido, vejo que não devem prosperar, visto que restou demonstrado o desinteresse do demandado em continuar no serviço público municipal, tanto que, mesmo citado pessoalmente, não apresentou qualquer justificativa, minimamente razoável, a fim de esclarecer sua ausência ao serviço que lhe fora incumbido.
Do mais, o múnus do magistério não harmoniza com comportamentos que o desqualifica, posto que os valores que carrega consigo, são caros demais para serem desconsiderados, enquanto função pública do mais elevado prestígio, cuja excelência, depende os rumos da nação.
Não se pode esquecer, também, que o futuro de diversas crianças e adolescentes dependem, diretamente, da qualidade da educação que lhes é ofertada – e isso passa pela qualificação continuada de educadores, do sério compromisso com o currículo escolar, do planejamento e formulação de estratégias para o enfrentamento da tão nefasta evasão escolar e de uma estrutura mínima capaz de proporcionar um aprendizado satisfatório – e, agentes públicos descompromissados com essas premissas, em nada contribuem para o pleno desenvolvimento destas crianças e adolescentes, pelo que devem ser, imediatamente, excluídos dos quadros do funcionalismo público.
Não custa lembrar, por outro lado, que este órgão julgador – sempre amparado nos princípios norteadores da Administração Pública, em especial, os princípios da legalidade e impessoalidade -, tem sempre como razão de decidir as provas que carreiam os autos dos processos instruídos pela Comissão de Processo Administrativo Disciplinar, não se subordinando, sob pena de se incorrer em Ato de Improbidade Administrativa, Crime de Responsabilidade e Prevaricação, a pressões externas/alheias à provas que contam nos autos.
Chefiar a alta Administração Pública, sem dúvida, constitui um privilégio nos regimes democráticos, contudo, também carrega consigo a responsabilidade e o dever de zelar pela coisa pública e pela excelência da prestação de seus serviços, tão indispensáveis aos cidadãos, cuja burla configuraria afronta imperdoável.
Portanto, decisão diferente deste órgão julgador seria o mesmo que declarar aos demais servidores deste Poder Municipal, que comportamentos totalmente destoantes dos princípios norteadores da Administração Pública seriam tolerados. Deste modo, e não coadunando com práticas desviantes de seus subordinados, pois inaceitáveis, sob pena de se incorrer em Ato de Improbidade Administrativa, entendo que a melhor decisão, nos termos do art. 132, inciso II, da Lei 8.112/90, é pela demissão do Requerido.
Art. 132.A demissão será aplicada nos seguintes casos:
II - abandono de cargo.
Nestes autos, verifica-se, de pronto, que o Requerido se enquadra no disposto nos art. 41, 132 e 138 da Constituição Federal de 1988 e da Lei nº 8.112/90, respectivamente.
Por tudo que fora exposto, de se concluir que restou configurado, nestes autos, o abando de cargo pelo Requerido, na forma do art. 138, da Lei 8.112/90, bem como na Lei Municipal 107/90, devendo incidir a penalidade de demissão, nos moldes do art. 148, inciso III, do mesmo diploma legal.
Consigno, por derradeiro, que esta Decisão Final acata, por determinação legal, o Relatório da Comissão de Processo Administrativo Disciplinar, como determina o art. 168, da Lei 8.112/90, salvo se existente prova nos autos noutro sentido, o que não é o caso.
III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, em concordância com a Recomendação da Comissão de Processo Administrativo Disciplinar, assim como com o Parecer jurídico, decido, com fundamento no art. 132, inciso II, da Lei 8.112/90 e no art. 148, inciso III, Lei Municipal 107/90, aplicar a penalidade de DEMISSÃO ao servidor Reginaldo dos Reis da Silva (MT 780243), CPF nº 940.578.773-04.
Intime-se o Requerido, pessoalmente, do interior teor desta decisão, bem como seu advogado, caso constituído nestes autos, para que no prazo legal, caso queira, apresente recurso, oportunizando vistas e cópias destes autos. Publique-se portaria de demissão no Diário Oficial do Município de Bom Jardim/MA, após o trânsito em julgado desta decisão.
Após, com o trânsito em julgado da presente decisão, remetam-se cópia à Justiça Eleitoral e ao Ministério Público, para efeitos do artigo 1º, inciso I, alínea “O”, da Lei Complementar 64/1990.
Transcorrido o prazo legal para a apresentação de Recurso e cumpridas as movimentações de praxe, arquivem-se os autos.
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CHRISTIANNE DE ARAÚJO VARÃO
Prefeita Municipal